O Supremo Tribunal Federal (STF) restabeleceu nesta quarta-feira (16) o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre operações de crédito, câmbio e seguros, validando com efeito imediato e retroativo o Decreto 12.499/2025. A decisão, proferida pelo ministro Alexandre de Moraes, mantém suspenso apenas o trecho que previa taxação sobre operações de “risco sacado”, mas dobra as alíquotas para pessoas jurídicas — inclusive microempreendedores individuais (MEIs) e empresas optantes pelo Simples Nacional. O governo projeta arrecadar R$ 11,5 bilhões extras em 2025 e R$ 28,5 bilhões em 2026, reforçando o cumprimento do arcabouço fiscal.
Decisão do STF devolve vigor ao decreto
No voto monocrático, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que o Congresso “invadiu competência privativa do Executivo” ao sustar o decreto via Projeto de Decreto Legislativo (PDL). Segundo ele, o aumento do IOF respeita o teto legal de 3,38% ao ano para operações de crédito e atende à finalidade regulatória prevista na Constituição. Com isso, o PDL fica suspenso até julgamento definitivo no plenário virtual, mas os contribuintes devem recolher o tributo retroativamente a 12 de junho, data da publicação do decreto.
Novas alíquotas: veja as mudanças
- Crédito para qualquer pessoa jurídica: alíquota fixa de 0,95% mais 0,0041% ao dia, limitada a 3,38% ao ano — anteriormente o teto era 1,88%.
- Crédito para empresas do Simples Nacional (até R$ 30 mil): alíquota fixa sobe de 0,38% para 0,95%, e a diária dobra de 0,00137% para 0,00274%, chegando a 1,95% ao ano.
- Operações de câmbio (compra de moeda): volta a 3,5% por transação.
- VGBL acima de R$ 600 mil/ano: passa a recolher 5% de IOF.
O aumento do IOF impacta transversalmente o fluxo de caixa das empresas, incidindo tanto sobre novos empréstimos quanto sobre renovações de contratos e adiantamentos de recebíveis. Especialistas destacam que o imposto é cobrado “por fora” e não gera crédito tributário, elevando assim o custo financeiro efetivo.
Maior impacto para MEIs e empresas do Simples
O Brasil possui mais de 15 milhões de MEIs, responsáveis por 29% do PIB de serviços e 55% dos empregos formais gerados em 2024, segundo o Sebrae. Para esses empreendedores — que costumam buscar capital de giro com ticket médio inferior a R$ 20 mil — a duplicação da alíquota representa pagar cerca de R$ 195 a cada R$ 10 mil financiados, contra R$ 88 antes da medida.
Ana Paula da Silva, consultora de finanças do Sebrae-SP, comenta que o aumento do IOF ocorre “em um momento de juros ainda altos e margens apertadas, encarecendo linhas de antecipação de recebíveis vitais para o pequeno varejo”.
O economista Murilo Viana, da Consultoria Tendências, ressalta que o IOF “entra direto no caixa da União, sem repasse a estados ou municípios, garantindo liquidez imediata ao Tesouro”.
Governo busca espaço no arcabouço fiscal
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defende que “90% do decreto é incontroverso” e necessário para evitar cortes adicionais no orçamento. A pasta calcula que cada ponto percentual do PIB em renúncia representa R$ 113 bilhões. Como a revisão de tributos estruturais exige lei ordinária e vigência no exercício seguinte, o aumento do IOF tornou-se a solução mais rápida para fechar as contas de 2025.
Em nota técnica, a Instituição Fiscal Independente (IFI) alerta que a medida é paliativa: a elasticidade-receita do IOF é baixa e depende do nível de atividade econômica, que pode desacelerar diante do crédito mais caro.
Congresso versus Executivo: disputa por competências
A Frente Parlamentar do Empreendedorismo acusa o governo de “desviar a finalidade”, alegando que o decreto tem caráter predominantemente arrecadatório, violando o artigo 150 da Constituição. Por outro lado, a Advocacia-Geral da União defende que “a tributação corrige distorções de alíquotas entre pessoas físicas e jurídicas, promovendo isonomia”. Esse embate reforça a tendência à judicialização de temas fiscais: desde 2015, mais de 70 atos do Executivo relacionados ao IOF foram questionados no STF, com impacto potencial de R$ 38 bilhões, segundo levantamento da FGV.
A constitucionalista Vera Chemim pondera que “ainda que o STF reconheça poder discricionário do Executivo, qualquer aumento do IOF deve demonstrar finalidade regulatória e razoabilidade econômica”.
Risco sacado: por que ficou de fora?
A única vitória do Congresso foi excluir o risco sacado — operação em que empresas antecipam faturas mediante cessão de recebíveis sem coobrigação. Como o Banco Central não classifica essa modalidade como crédito tradicional, a cobrança do IOF foi considerada desproporcional. O setor fatura cerca de R$ 250 bilhões ao ano e a exclusão preserva, segundo a Associação Brasileira de Factoring, 600 mil pontos da cadeia de fornecedores.
Insegurança jurídica e percepção de mercado
Analistas de risco soberano alertam que mudanças repentinas no IOF elevam o prêmio exigido pelos investidores. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) calcula que a taxa interna de retorno exigida em debêntures de infraestrutura subiu 0,3 ponto percentual após o decreto. “Fica difícil planejar fluxo de caixa quando o imposto sobre crédito muda da noite para o dia”, afirma Gabriel Vieira, tributarista do escritório L.O.Baptista.
Relatório do Banco Itaú BBA projeta repasse de custos às cadeias produtivas, pressionando preços ao consumidor em até 0,05 ponto percentual no IPCA de 2025 — um impacto pequeno, mas relevante em um cenário de meta de inflação apertada.
Orientações para contadores aos clientes
- Revisar contratos vigentes: empréstimos com saldo devedor após 12 de junho já sofrem nova alíquota; ajuste o fluxo de pagamentos contábeis.
- Simular custo efetivo total: negociar taxa de juros sem considerar o aumento do IOF pode mascarar o custo financeiro real.
- Avaliar antecipação de receitas: linhas como factoring tradicional ou FIDC podem compensar a alta, mas exigem análise de giro e garantias.
- Planejar capital de giro: reservar caixa para o tributo à vista evita multas e juros de mora, que variam em torno de 0,33% ao dia.
- Atenção ao câmbio: empresas importadoras devem incluir na precificação o retorno do IOF a 3,5%.
Próximos passos no STF
O caso será analisado pelo plenário entre 19 e 26 de julho. Se confirmada a liminar, o aumento do IOF permanecerá até que o Congresso aprove legislação específica ou o Executivo edite novo decreto. Parlamentares já articulam projeto de lei para limitar variações do IOF a 50% da Selic acumulada, com vacância mínima de 90 dias.
A decisão do STF restabelece, por ora, o aumento do IOF como instrumento de curto prazo para equilibrar as contas públicas, mas transfere o custo a MEIs e empresas do Simples, que já enfrentam crédito caro e margens estreitas. Contadores devem recalcular o impacto nas rotinas financeiras e orientar clientes sobre alternativas de funding menos onerosas. Enquanto o impasse político-jurídico prossegue, recomenda-se acompanhar novas atualizações legais e manter planejamento tributário flexível.
Verifique se seus contratos de empréstimo foram emitidos após 12 de junho e ajuste imediatamente a provisão do IOF no fluxo de caixa para evitar autuações.