Desaceleração marca o setor de autopeças no varejo

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Desaceleração no Mercado de Autopeças

O mercado está parado. Essa é a percepção compartilhada por profissionais do Aftermarket Automotivo nos últimos dias. O varejo de autopeças enfrenta um período de desaceleração, e essa não é apenas a impressão de alguns, mas sim um fato comprovado pela principal pesquisa do setor, que monitora semanalmente a movimentação de vendas e compras de autopeças nas lojas de componentes automotivos em todo o país.

Dados coletados em tempo real pela pesquisa MAPA – Movimento das Atividades em Peças e Acessórios, entre maio e julho, registraram oito semanas consecutivas de queda na média nacional, tanto nas vendas quanto nas compras. Essas quedas foram ainda mais evidentes e constantes nas regiões Sudeste e Sul, que concentram a maior parte da frota nacional.

Embora o período de queda entre 23 de maio e 11 de julho tenha sido interrompido na semana encerrada em 18 de julho, essa breve recuperação foi seguida por um novo e mais acentuado recuo, conforme ilustram os gráficos abaixo.

Desaceleração no setor de autopeças no varejo
Desaceleração no setor de autopeças no varejo

Além dos dados estatísticos coletados pelo After.Lab – núcleo de inteligência de negócios do Grupo NHM – Novomeio Hub de Mídia –, que também considera a percepção dos varejistas das cinco regiões do Brasil, a desaceleração do mercado tem chamado a atenção de líderes e formadores de opinião de todo o setor.

Marco Antônio Vieira Machado, presidente do Sincopeças-RS, destaca que essa situação é real no Rio Grande do Sul e reflete principalmente um momento crítico da saúde financeira da população, que se vê obrigada a adiar planos e necessidades relacionadas à manutenção automotiva. “Embora essencial, a manutenção automotiva depende da condição financeira do consumidor final. Se ele não dispõe de recursos favoráveis, segurará a mão na hora de gastar, resultando em menor volume e faturamento para as lojas, o que impacta as compras junto aos fabricantes, provocando um efeito cascata por toda a cadeia automotiva”, explica Machado.

Segundo ele, o cenário observado no varejo de autopeças não é um fenômeno isolado, mas resultado de fatores macroeconômicos que pressionam o consumo em todo o país, como o aumento nos preços de alimentos, combustíveis, energia, aluguéis e o elevado nível de endividamento das famílias.

Dados da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) ilustram essa situação: em junho de 2025, o volume de consultas por crédito – importante indicador da propensão ao consumo – caiu 14,11% em relação a maio e 10,55% em comparação a junho de 2024. A CNDL classifica esse cenário como um “compasso de espera” tanto por parte dos consumidores quanto das instituições financeiras.

Para José César da Costa, presidente da CNDL, essa retração está diretamente ligada à cautela do mercado diante de um ambiente de crédito mais caro e menos acessível. “Com juros elevados e alto índice de inadimplência, consumidores e instituições financeiras adotam uma postura mais conservadora”, afirma. Ele também destaca que a elevação do IOF e o custo total das operações dificultam o acesso ao financiamento, limitando a capacidade de compra da população.

Outro dado que reforça essa análise é o aumento do percentual de consumidores com restrições no CPF durante consultas de crédito, que atingiu 35,44% em junho, frente a 34,53% em maio. Roque Pellizzaro Júnior, presidente do SPC Brasil, ressalta o impacto da política monetária: “A manutenção da taxa Selic em patamar elevado tende a prolongar esse cenário. O crédito segue caro, os bancos permanecem conservadores e os níveis de endividamento e inadimplência continuam pressionados”.

Consistência no Mercado

Heber Carvalho, presidente do Sincopeças-SP, destaca outro aspecto que influencia a desaceleração do varejo de autopeças no país: a venda de veículos novos. “Quando as vendas de veículos novos estão em alta, como atualmente, sentimos uma queda em nosso mercado”, comenta.

Esse alerta encontra respaldo nos números da Fenabrave, que indicam que o primeiro semestre de 2025 registrou a venda de 1.198.805 veículos novos no Brasil – automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus –, um crescimento de 4,82% em relação ao mesmo período do ano anterior. Esse avanço é ainda mais expressivo se comparado a 2023, quando foram vendidos pouco menos de 1 milhão de veículos, representando um aumento acumulado superior a 20% em dois anos.

Focando em veículos leves, foram registrados 878.604 emplacamentos entre janeiro e junho de 2025, um crescimento de 3,52% sobre o mesmo período de 2024.

Conforme Carvalho, esse aumento, embora positivo para montadoras e concessionárias, contribui para a retração no varejo de autopeças, já que veículos novos, ainda sob garantia e com menor necessidade de manutenção ou troca de peças, tendem a postergar a demanda por oficinas e lojas especializadas, especialmente em itens de desgaste ou reposição.

Modernização do Varejo Refletida na Confluência entre Vendas e Compras

Para enfrentar esse cenário desafiador, Heber Carvalho destaca a importância de manter estoques precisos e com controles rigorosos. Ele reforça que a adoção de sistemas de gestão modernos facilita a atualização em tempo real dos dados, tornando imprescindível o investimento em tecnologia pelas empresas.

Os dados da pesquisa MAPA indicam que o setor está bem preparado para ajustar seus estoques conforme o volume de demanda. O volume de compras tem acompanhado a movimentação das vendas durante as oito semanas de queda consecutiva, tendo até aumentado durante o breve período de alta em julho, para depois diminuir novamente com a retomada da queda na demanda.

Essa correlação entre vendas e compras demonstra não apenas a atenção do varejo, mas também a crescente sofisticação das ferramentas de tomada de decisão. O uso de sistemas integrados de gestão de estoques, conectados a dados de vendas em tempo real, permite que os lojistas ajustem rapidamente seus pedidos, reduzindo riscos de excesso, perdas por obsolescência ou rupturas em momentos de maior giro.

A digitalização da cadeia de suprimentos é apontada como uma das principais estratégias do varejo moderno. Segundo levantamento da McKinsey, empresas que adotam soluções tecnológicas com visibilidade ponta a ponta em suas operações alcançam ganhos significativos, tais como:

  • Redução de 20% a 30% nos custos operacionais;
  • Melhoria de 10% a 20% no atendimento ao cliente;
  • Diminuição de 50% no tempo de ciclo da cadeia de suprimentos.

Apesar dos benefícios comprovados e da crescente oferta de ferramentas, o mesmo estudo indica que apenas 13% das empresas brasileiras extraem todo o valor dessas tecnologias, evidenciando grande potencial para evolução, mesmo entre negócios mais estruturados.

No varejo de autopeças, que lida com uma ampla variedade de SKUs, margens apertadas e consumidores exigentes, essa agilidade e inteligência na reposição podem fazer toda a diferença, especialmente em um contexto de desaceleração, onde erros no abastecimento podem gerar prejuízos duplos: capital imobilizado e baixa conversão.

Assim, embora o setor tenha se adaptado bem recentemente, especialistas recomendam investir em tecnologia, aprimorar processos de controle e capacitar equipes para interpretar dados, garantindo a melhor preparação para enfrentar cenários instáveis e sair fortalecido para crescer.

5 Dicas para Gestão de Estoque

1. Conheça bem o seu cliente

Compreender o perfil do consumidor, incluindo renda, localização e hábitos, permite um abastecimento mais preciso da loja, reduzindo sobras e maximizando vendas. Cada região pode demandar produtos diferentes, e o estoque deve refletir essas particularidades.

2. Analise o desempenho dos produtos diariamente

No varejo, tudo muda rapidamente. Um produto líder hoje pode encalhar amanhã. Monitorar o giro e a cobertura dos produtos diariamente possibilita reposições ágeis e remarcações preventivas, evitando prejuízos e melhorando o atendimento ao cliente.

3. Não se apegue emocionalmente ao estoque

Estoque parado representa capital imobilizado. Mesmo que seja difícil, é melhor vender com margem reduzida do que acumular produtos antigos e perder espaço para novidades. Renovar o estoque regularmente é essencial para manter o giro e a atratividade da loja.

4. O que se compra deve ser exposto

Comprar mais do que o espaço disponível é um erro comum. Um mix bem planejado, baseado em dados e capacidade de exposição, evita acúmulo no depósito e excesso nas prateleiras, que confundem o consumidor e prejudicam a experiência de compra.

5. Tenha fornecedores parceiros, não apenas baratos

Preço não é tudo. Entrega no prazo, qualidade e comprometimento também são fundamentais. Avalie fornecedores criteriosamente e valorize aqueles que agregam valor real à operação, indo além de descontos pontuais.