isenção de IR até R$ 5 mil pode impulsionar consumo de bens e serviços em R$ 17 bi

Isenção de IR até R$ 5 mil pode aumentar consumo em R$ 17 bilhões no Brasil

A ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para rendas de até R$ 5 mil mensais, prevista no Projeto de Lei nº 1.087/2025 já aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado, deve aquecer o varejo no curto prazo. No entanto, a medida também levanta questionamentos sobre a sustentabilidade fiscal e possíveis distorções tributárias, que podem desestimular a formalização e o investimento produtivo.

De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), cerca de 54,5% da renúncia fiscal estimada em R$ 31,2 bilhões para 2026 — ou seja, R$ 16,98 bilhões — devem ser direcionados ao consumo de bens e serviços. Outros 33,6% (R$ 10,47 bilhões) tendem a ser usados para quitar dívidas, enquanto 12% (R$ 3,75 bilhões) devem ir para a poupança ou consumo futuro.

“Reconhecemos o esforço do governo em promover justiça tributária e incentivar o consumo de quem mais precisa. A isenção do IR até R$ 5 mil vai colocar dinheiro no bolso de 14 milhões de brasileiros e deve impulsionar o comércio de alimentos, saúde e itens básicos. No entanto, precisamos olhar além do curto prazo”, destaca José Roberto Tadros, presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac.

A proposta beneficia principalmente contribuintes das classes C, D e E, que deixarão de pagar IRPF. Para quem recebe exatamente R$ 5 mil, a economia mensal pode variar entre R$ 400 e R$ 500, dependendo das deduções no ajuste anual. O projeto ainda prevê um desconto decrescente para rendas entre R$ 5 mil e R$ 7.350, criando uma faixa de transição antes da tributação integral.

Impacto concentrado em bens não duráveis

O consumo extra tende a se concentrar em setores menos dependentes de crédito, já que a inadimplência atinge 30% das famílias, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor da CNC — um recorde em 15 anos. Hipermercados e supermercados devem absorver R$ 4,17 bilhões dos recursos adicionais; combustíveis e lubrificantes, R$ 1,67 bilhão; e farmácias e cosméticos, R$ 1,07 bilhão. Juntos, esses segmentos respondem por quase 80% do incremento. Artigos de uso pessoal e doméstico (R$ 660 milhões) e vestuário e calçados (R$ 620 milhões) completam a lista dos principais beneficiados.

Distorções tributárias

Apesar da aprovação unânime na Câmara e do forte apelo popular, a medida deve continuar gerando debate. Especialistas questionam se a mudança será suficiente para equilibrar as contas públicas, já que, para compensar a perda de arrecadação, o projeto propõe duas novas formas de tributação sobre altas rendas: a cobrança de 10% sobre lucros e dividendos acima de R$ 50 mil anuais — encerrando uma isenção que vigorava desde 1996 — e a criação do Imposto de Renda da Pessoa Física Mínimo (IRPFM). A alíquota mínima progressiva atingirá quem ganha mais de R$ 600 mil por ano, garantindo que esse grupo pague pelo menos 10% de imposto efetivo, independentemente de deduções e benefícios fiscais.

A tributação de dividendos, um dos pilares do projeto, é criticada por não seguir o princípio da integração, adotado em muitos países. Segundo a CNC, o lucro já é tributado na empresa via IRPJ e, ao ser novamente taxado na pessoa física sem compensação, ocorre uma dupla tributação sobre a mesma renda. Manter a carga tributária corporativa nos níveis atuais e ainda adicionar um novo encargo sobre a renda distribuída eleva o custo do capital produtivo no Brasil, reduzindo a competitividade internacional.

Incentivo indireto à informalidade

O desenho da faixa de transição, que reduz o benefício para rendas entre R$ 5 mil e R$ 7.350, cria a chamada “armadilha da renda”: a partir de R$ 5 mil, a alíquota marginal efetiva sobe abruptamente, ferindo o princípio de progressividade suave, que recomenda uma transição gradual entre as faixas de tributação. Essa distorção pode gerar desincentivos econômicos relevantes, como a recusa a horas extras ou promoções que elevem a renda para essa faixa de transição, além de estimular a informalidade para evitar o salto na tributação.