O peso dos juros elevados sobre os resultados das empresas e sobre o desempenho da economia brasileira dominou as discussões dos Conselhos de Serviços e de Comércio Atacadista da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), realizados em 17 e 18 de novembro. Empresários de diferentes segmentos manifestaram preocupação com a desaceleração recente dos negócios e com a possibilidade de esse cenário se prolongar ao longo de 2025.
Em apresentação aos conselheiros, o assessor econômico da FecomercioSP, Fabio Pina, trouxe dados que dimensionam o problema e analisou como o ambiente macroeconômico, a produtividade e o tamanho do Estado influenciam o custo do crédito e definem os principais desafios das empresas para os próximos anos.
Consumo e investimento sob pressão
Estudo inédito da FecomercioSP detalha o impacto dos juros no orçamento das famílias e no caixa das empresas. Em 2024, foram pagos R$ 1,148 trilhão apenas em juros, um aumento de 17% em relação a 2023. Desse total, R$ 859,9 bilhões saíram das famílias e R$ 287,9 bilhões das empresas.
O descompasso entre custo financeiro e geração de renda é evidente. A massa de rendimentos das famílias cresceu 3,2%, enquanto as despesas com juros avançaram 20,5%. Como resultado, 10,63% da renda familiar foi destinada ao pagamento de juros, ante 9,11% no ano anterior. O levantamento mostra que o mercado de crédito continua sendo o principal sustentáculo da demanda agregada, com aumento das concessões e queda da inadimplência.
A redução do volume de inadimplentes em um cenário de juros altos é um dado positivo, associado principalmente ao mercado de trabalho aquecido. Por outro lado, o comprometimento da renda das famílias e do caixa das empresas com dívidas aumenta. Ao mesmo tempo, a renda nacional se concentra cada vez mais no setor financeiro, sem que os rendimentos reais cresçam na mesma proporção — quadro que adiciona risco à sustentabilidade do consumo e dos investimentos.
Custo financeiro continua travando o investimento
No caso das empresas, o valor desembolsado com juros também deu um salto em 2024. Os pagamentos cresceram 7,8% na comparação com 2023, atingindo R$ 287,9 bilhões, após já terem avançado 21,9% no ano anterior em relação a 2022.
O saldo de inadimplência das pessoas jurídicas recuou 16,3%, de R$ 49,2 bilhões em 2023 para R$ 41,2 bilhões em 2024, reduzindo a taxa de 3,13% para 2,51%. Mesmo assim, o diagnóstico permanece: o custo financeiro continua sendo um dos principais entraves à retomada dos investimentos privados, ao lado da elevada carga tributária. O efeito é ainda mais severo entre Pequenas e Médias Empresas (PMEs), mais dependentes de capital de giro e com menor acesso a linhas de financiamento mais baratas.
Tabela 1 – Pagamento de juros das empresas (2022–2024)
Fontes: Banco Central, IBGE e FecomercioSP
2022
– Juros pagos: R$ 219,1 bilhões
– Inadimplência: R$ 32,8 bilhões
2023
– Juros pagos: R$ 267,1 bilhões (alta de 21,9%)
– Inadimplência: R$ 49,2 bilhões (alta de 49,8%)
2024
– Juros pagos: R$ 287,9 bilhões (alta de 7,8%)
– Inadimplência: R$ 41,2 bilhões (queda de 16,3%)
Estimativa
Serviços: desaceleração e projetos parados
No setor de Serviços, Pina destacou que vários indicadores apontam perda de tração no segundo semestre de 2024. Apesar de muitos segmentos ainda registrarem vendas positivas, as margens estão comprimidas e o custo do capital de giro pesa cada vez mais no caixa.
De acordo com o estudo, a taxa de juros média mensal para empresas permaneceu elevada, em 1,61%. Já o saldo de crédito para o setor avançou apenas 4,4% em 2024, muito aquém do necessário para destravar novos investimentos e modernização da capacidade instalada.
Atacado: crédito caro, consumo apertado
No Comércio Atacadista, o diagnóstico é semelhante. O crédito caro impacta toda a cadeia, pressionando o capital de giro, alongando prazos de recebimento e limitando a capacidade de recomposição dos estoques.
A queda da inadimplência entre empresas — em grande parte resultado de renegociações e da maior seletividade dos bancos — não se traduz em melhora do ambiente de negócios. Pelo contrário. Segundo o levantamento da FecomercioSP, o Brasil opera hoje com juros reais entre 7% e 8%, patamar que desestimula investimentos, reduz margens e dificulta a expansão tanto do Varejo quanto do Atacado.
Cenário até 2026
Na avaliação de Fabio Pina, 2025 tende a repetir o ritmo de 2024: juros ainda altos, inflação relativamente elevada (embora sob controle) e risco fiscal crescente. Uma melhora mais consistente é esperada apenas para 2026, quando o novo governo terá de apresentar um plano crível de reorganização das contas públicas. Só assim o País poderá reduzir juros de forma sustentável e retomar um ciclo mais robusto de crescimento.
“Estamos dançando na beira do precipício, mas ainda não caímos”, resumiu o economista, ao alertar que, sem reformas estruturais, o ajuste mais duro pode ficar para 2027.
Como as empresas podem reagir
Diante de juros persistentemente elevados e da perspectiva de desaceleração econômica, a FecomercioSP sugere algumas diretrizes para a gestão financeira das empresas:
- Reavaliar o fluxo de caixa e o ciclo operacional – antecipar recebimentos, renegociar prazos com fornecedores e rever políticas de estoque podem reduzir a necessidade de capital de giro.
- Buscar linhas de crédito mais baratas e novas garantias – programas como Pronampe, fundos garantidores e operações estruturadas ajudam a diminuir o custo médio da dívida.
- Investir em eficiência operacional – automação, digitalização e revisão de processos são caminhos para compensar a compressão das margens.
- Evitar endividamento de curto prazo – com taxas ainda elevadas, é estratégico priorizar financiamentos mais longos e com maior flexibilidade.
- Monitorar a agenda fiscal e regulatória – as decisões políticas e econômicas de 2026 serão determinantes para juros, inflação e crescimento. Planos de médio e longo prazo precisam considerar diferentes cenários para o próximo ciclo presidencial.
Mesmo sob forte pressão financeira, os setores de Serviços e de Comércio Atacadista seguem com papel central na economia brasileira. A FecomercioSP alerta, porém, que, sem mudanças estruturais, o País continuará desperdiçando potencial de crescimento, enquanto famílias e empresas seguem arcando com um custo financeiro que limita consumo, investimento e geração de empregos.
















